FABULA DOS PORCOS ASSADOS – SENSO-COMUM

Por Ulisses Abreu.

Quando o homem ainda era das cavernas, houve um incêndio num bosque, onde se encontravam alguns javalis.  Sem saída, todos os porcos foram assados.

Javali – foto site Scavenger

Acostumados a comer carne crua, os homens experimentaram a carne assada e acharam deliciosa.

Parte de ilustração em revista Superinteressante de 18 de abr de 2011 e atualizada em 04 de jul de 2018

Assim, todas as vezes que desejavam comer porco assado, incendiavam um bosque.

Depois de algum tempo, aqueles homens se reuniram para discutir uma nova tecnologia para assar porcos, uma vez que as coisas não iam bem. Ou os javalis ficavam muito queimados e inaproveitáveis ou crus demais.

A demanda cresceu demasiadamente e o sistema utilizado falhava constantemente com perdas vultosas e preocupante. Centena de pessoas trabalhavam nessa tarefa e, curiosamente, quanto mais gente era contratada para esse trabalho, mais falhas ocorriam e as perdas eram crescentes. Com essa deficiência constante, aumentavam as queixas e um clamor geral.

Desta forma, havia necessidade de uma reforma profunda no SISTEMA.

Para isso, todos os anos, realizavam-se congressos, seminários, conferências e jornadas para se buscar uma solução para melhoria desse mecanismo, entretanto no ano seguinte repetiam-se os congressos, os seminários e as jornadas e os problemas continuavam os mesmos.

ilustração de sistema de trabalho em equipe site Freepik

Os debates se intensificavam na discussão das causas do fracasso do SISTEMA. Os especialistas mais renomados atribuíam à indisciplina dos porcos, que não permaneciam no mesmo local; outros, a inconstante natureza do fogo difícil de controlar; às árvores excessivamente verdes; a umidade da terra; ou a falha do serviço meteorológico, que não acertava o lugar, momento e a quantidade de chuva e os debates se estendiam…

Realmente as causas eram difíceis de determinar. O SISTEMA para assar porcos era muito complexo e, para isso, fora montada uma grande estrutura, com máquinas e equipamentos. Houve institucionalização do trabalho.

Foram contratados pessoas dedicadas a acender o fogo – OS ACENDEDORES, que também eram especialistas de setores das Zonas Nortes, Leste e Oeste. Incendiadores diurnos e noturnos, com larga especialização no setor; Incendiador de Verão e Inverno, com disputas jurídicas para se tornarem também de Outono e Primavera. Havia especialistas em vento – os ANEMOTÉCNICOS; Diretores de assamento e Alimentação em Assados; um Diretor de Técnicas Ígneas

com seu conselho geral de assessores; um Administrador Geral de Florestamento Incendiável; uma Comissão Nacional de Treinamento profissional em Porcologia; um Instituto Superior de Cultura e Tecnologia em Alimentos (ISCUTA) e o BODRIO (Bureau Orientador de Reforma Ígneo-Operativa).

O BODRIO era um órgão imenso. Tão grande, que tinha um Inspetor para cada 7.000 (sete mil) porcos. O BODRIO cresceu tanto que se burocratizou e propiciava anualmente os congressos, seminários, conferências e jornadas até no exterior.

O Congresso, em reunião plenária, havia aprovado um projeto de crescimento e desenvolvimento de novo bosques e selvas, após parecer técnico, que indicavam não só a direção dos ventos, como o seu tempo de duração e o percentual de umidade do solo.

Milhares de pessoas já trabalhavam na preparação do solo e plantio das novas florestas, que seriam posteriormente incendiadas.

Da Europa e Estados Unidos se buscou cooperação para o plantio das melhores sementes de madeiras para fogo e de novas ideias de como fazer buracos, onde os porcos caíssem com maior facilidade; de grandes instalações para aprisionar os animais antes dos incêndios e portinholas para soltar gradativamente os porcos na hora do fogo. Nas grandes Universidades do exterior, professores treinavam especialistas em porcologia e ensinavam como aplicar o fogo, triangularmente, logo após a raiz quadrada de A-1, pela velocidade do vento sul e soltar os porcos quinze minutos antes de o fogo-premédio da floresta alcançar 47 graus.

Os debates eram intensos e os especialistas apresentavam trabalhos acadêmicos com .divergências profundas.

Certo dia, JOÂO SENSO-COMUM, um simples INCENDIADOR com licenciatura em verão chuvoso, procurou o DIRETOR GERAL para lhe dizer que toda aquela problemática era fácil de resolver.

Mataria o porco, depois de limpo e cortado aos pedaços, colocaria numa grelha e o assaria sobre brasas. Simples assim.

O DIRETOR GERAL depois de ouvir a exposição de JOÃO SENSO COMUM, disse-lhe:

– O que o senhor fala está certo na teoria, entretanto, na prática não dá certo. Se o que sugere fosse adotado, o que faria com o ANEMOTECNICO?

– Não sei, respondeu JOÃO.

– Onde vamos colocar os ACENDEDORES das diversas especialidades?

– Não sei. – O que faço com esse contingente imenso de especialista em porcos, inclusive os que estudaram no exterior? O que faço com meu parente

Presidente da Comissão de estudos para aproveitamento de resíduos? E o Presidente da Comissão de Vendas, que reside na Suíça e foi nomeado por indicação do nosso atual mandatário?

-Não sei.

– Agora que você conhece o problema, não saia falando bobagem por aí, que conserta tudo. Isso mexe com toda nossa estrutura e pode trazer sérios problemas para você e seu cargo está em jogo. Eu estou te entendendo, mas pode outro seu chefe, menos compreensivo, te mandar embora, não é?

João Sentido Comum se despediu e saiu cabisbaixo, meio atordoado e nunca mais falou nesse problema.

Por esse motivo, quando se fala em reforma de melhoria de um Sistema, costuma-se se dizer:

FALTA SENSO COMUM. E NO BRASIL?

Adaptada de fabula espanhola por Ulisses Abreu

Em 20.05.2022

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