Mama África
Um continente mais de cinco vezes maior que o Brasil, berço da potente humanidade – que nos diga Luzia milagrosamente salva do incêndio no Museu Nacional – de onde viemos e para onde vamos hoje.
É para a África que eu quero ir hoje, a mesma que o escritor moçambicano Mia Couto descreve com precisão em seus livros de beleza sem igual.
A de língua portuguesa, a que veio nos navios negreiros com a divina poesia realista de Castro Alves, a que é berço de fauna e flora de valores inimagináveis.
A que gostaria de conhecer com olhos negros feito o breu, feito as mãos e os pés que cruzaram o mar do corpo humano que venceu. Ninguém morreu.
Tantas letras feito eu na escuridão das senzalas. Sou mais tua, terra batida e pisada, dilacerada nos cantos e recantos da espremida e efervescente favela de faíscas mil.
A Adjna, uma querida amiga de Luanda, colega de Mestrado na Universidade de Coimbra, disse-me:
- Consuelo, você não tem ideia do que é a África. Os ditadores devoram nossos abundantes recursos naturais, fauna e flora, com maior velocidade que os do Brasil. Somos tão pobres que comemos terra. Tribos inimigas guerreiam porque aqui fomenta-se o ódio, nunca a paz.
No dialeto Yoruba, Luanda significa “a junção da Lua e da Terra”. No Bantu, “Paz e Terra imaginária”. Luanda era a cidade onde os africanos davam seu último adeus à África.
Luanda é também a cidade mais cara para se viver no mundo. A economia gira em torno da extração de diamantes e petróleo.
Bolsões de muita pobreza estão no entorno da rica Luanda, testemunhos insólitos da péssima distribuição das riquezas. São as favelas que escrevem a sordidez dos governantes de Angola em sua capital Luanda.
(Mapa :Pinterest.com)
Aqui nada é diferente.
Não sei nomear qual é colônia de quem. Quem é latifúndio de qual lugar. Só sei que a língua portuguesa ficou brasileira depois de Uganda se misturar à Bahia de São Salvador.
Partiram de Luanda os muitos navios de escravos negros para o Brasil, talvez por isso seja o último adeus à terra amada para nunca mais ouvir os tambores de outrora da querida maloca.
É também do sul da África que vem o Ômicron, a nova cepa do Covid-19 com aproximadamente 50 mutações, 30 na proteína Spike, a chave que o vírus usa para entrar nas células e que é alvo da maioria das vacinas contra Covid.
A desiguldade é o xeque mate do peão à rainha. É ela que está definindo o jogo no tabuleiro preto e branco do xadrez dos continentes anti África.
A desiguldade está matando a nata da sociedade. É a favela invadindo a Casa Grande sem fazer guerra, nem derramar uma gota de sangue.
Só uma lágrima sem cor fica no rosto de quem vive esta tragédia anunciada.